Ao menos cinco bancos no país começaram a oferecer o crédito consignado do BPC (Benefício de Prestação Continuada) após o STF (Supremo Tribunal Federal) julgar o tema e o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) publicar as regras da medida. Dois deles se preparam para retomar a linha e uma instituição diz avaliar a liberação.
O empréstimo para quem recebe renda assistencial de um salário mínimo —hoje em R$ 1.320— foi considerado constitucional pelo Supremo em julgamento que terminou na segunda-feira (11).
Dentre os bancos que já voltaram a oferecer estão Banco do Brasil, Mercantil, C6, Bradesco e Itaú Unibanco. Caixa Econômica Federal diz que iniciou as adequações necessárias para a retomada, PagBank afirma estar se preparando e Banrisul está avaliando. BMG e Nubank disseram que não participariam da reportagem. Os demais não responderam.
O consignado é um empréstimo com desconto direto no benefício. Pelas regras, o segurado pode comprometer até 30% da renda com empréstimo pessoal e mais 5% com o cartão de crédito, cartão de benefício ou saque.
Os juros são controlados pela Previdência Social, por meio do CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social) e, nesta modalidade, valem as regras aprovadas para aposentados e pensionistas.
O empréstimo pode ser feito em até 84 parcelas, o que dá sete anos. As taxas máximas são de 1,91% ao mês para o empréstimo pessoal consignado e de 2,83% ao mês para o cartão.
Os bancos têm liberdade para escolher se querem ou não operar o empréstimo, e podem passar a oferecer ou deixar de ofertar conforme julgarem conveniente. Os juros podem ser menores do que os definidos pela Previdência, mas não maiores.
Para especialistas, a liberação deste tipo de crédito é preocupante, por um lado, por se tratar de uma parcela vulnerável financeiramente, já que o BPC é um benefício ligado à Loas (Lei Orgânica da Assistência Social). Por outro lado, é uma forma de incluir essa população no acesso a um crédito que é controlado e tem regras que visam limitar o endividamento.
Tem direito ao BPC idosos a partir de 65 anos e pessoas com deficiência que façam parte de família com renda per capita (por pessoa da família) de até um quarto do salário mínimo, o que dá R$ 330 neste ano. Não é preciso ter contribuído com o INSS para conseguir o benefício. Diferentemente de aposentadoria, pensão e auxílios, os beneficiários não recebem 13º.
Os juros ofertados pelos bancos variam de 1,70% ao mês a 1,91% ao mês para o empréstimo pessoal. No caso do cartão, são de 2,83%. O máximo que pode ser comprometido com o empréstimo pessoal por mês é R$ 396. O Itaú Unibanco oferece crédito com parcela mínima a partir de R$ 150.
Veja os juros oferecidos pelos bancos, ao mês, para o crédito consignado
Banco | Empréstimo pessoal consignado | Cartão consignado |
---|---|---|
Banco do Brasil | 1,76% a 1,89% | não informou |
Itaú Unibanco | 1,91% | ainda não está disponível |
Mercantil | 1,91% | 2,83% |
PagBank | 1,70% | não oferece |
C6 | 1,91% | não informou |
Bradesco | não informou | não informou |
Caixa Econômica Federal* | 1,70% | está suspenso |
*O banco público ainda se prepara para retomar a linha de crédito, mas deverá oferecer as mesmas condições que há hoje para aposentados e pensionistas
Cíntia Senna, sócia-executiva da Dsop, organização com foco em educação financeira, afirma que qualquer oferta de crédito deve ser analisada com muito cuidado, porque, ao fazer a contratação, o beneficiário vai comprometer a renda por muitos meses.
“Para que eu possa acessar um empréstimo, preciso pensar que ele vai ter que ser pago com juros e correção. No caso do BPC, é preciso lembrar ainda que já vou receber o meu benefício com essa prestação descontada. A atenção primária é saber que, nos próximos meses, vou ter que conviver com renda menor”, afirma.
Outro problema, segundo Cíntia, é o fato de que o BPC é um benefício que não é vitalício, ou seja, pode ser cortado caso o cidadão melhore sua condição e fique fora das regras de pagamento. Por isso, quem vai tomar o empréstimo para empreender precisa se organizar para conseguir, de fato, gerar renda suficiente para se manter caso entre na linha de corte do benefício.
“É preciso ver qual será o destino [do valor emprestado]. Vai me trazer renda ou vai me gerar mais custo? Esse é um detalhe importante a se observar, não só para quem tem o BPC e faz empréstimo, mas para a população como um todo.”
A educadora financeira também diz que é preciso ficar atento ao assédio de bancos e financeiras ou mesmo a golpes, porque o beneficiário acaba ficando mais suscetível a quem comete crimes financeiros. A principal dica é nunca assinar nenhum documento sem saber do que se trata e ter cuidados redobrados ao fechar um empréstimo a distância, por internet, telefone ou caixa eletrônico, porque pode ser tratar de fraude.
A pedido da Folha, Cíntia e Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de estudos e pesquisas da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), fizeram simulações de empréstimo, conforme as regras oferecidas pelos bancos. Veja:
Quanto é possível emprestar, valor da prestação e quanto terá de pagar
1 – Empréstimo com taxa de juros de 1,91% ao mês, com prazo de 84 meses
- Valor máximo do empréstimo: R$ 16.501,91
- Valor da prestação: R$ 396
- Valor total pago ao final do contrato: R$ 33.264
- Quanto será pago de juros: 16.762,06
2 – Empréstimo com taxa de juros de 1,70% ao mês, com prazo de 84 meses
- Valor máximo do empréstimo: R$ 17.641,02
- Prestação: R$ 396
- Total pago ao final do contrato: R$ 33.264
- Quanto será pago de juros: 15.622,98
3 – Empréstimo mínimo de R$ 150, com juros de 1,91% e prazo de 84 meses
- Valor máximo do empréstimo: R$ 6.250,72
- Prestação: R$ 150
- Total pago ao final do contrato: R$ 12,6 mil
- Quanto será pago de juros: R$ 6.349,28
4 – Empréstimo mínimo de R$ 150, com juros de 1,70% e prazo de 84 meses
- Valor máximo do empréstimo: R$ 6.682,21
- Prestação: R$ 150
- Total pago ao final do contrato: R$ 12,6 mil
- Quanto será pago de juros: R$ 5.917,79
As simulações não consideram a cobrança de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) nem as taxas de contratação, que podem variar de banco para banco
De acordo com o INSS, há hoje 5,5 milhões de cidadãos recebendo o BPC. Do total, 1,7 milhão já tem ao menos um contrato de empréstimo consignado ativo. Isso porque a medida havia sido liberada no ano passado e, depois, perdeu a validade. Dos segurados que têm empréstimo, o valor médio descontado, diz o órgão, é de R$ 434,97 atualmente.
O que dizem os bancos
O Banco do Brasil informa que retomou as contratações da linha de empréstimo consignado para quem recebe o BPC no dia 14 de setembro, após o INSS publicar a instrução normativa com as novas regras de contratação. O BB opera no convênio do INSS com taxas que variam de 1,76% a 1,89% ao mês e com o prazo de até 84 meses.
O Banco Mercantil afirma que oferece o crédito consignado para beneficiários do BPC, seguindo os normativos do INSS, com taxa de juros de 1,91% e o máximo de parcelas é 84. O Mercantil também oferece o cartão consignado com juros de 2,83% ao mês.
O PagBank informa que já possui uma carteira deste benefício desde o ano passado e manteve os clientes quando as operações foram interrompidas. Agora, o banco se prepara para retomar o empréstimo, conforme as regras. Os juros são de 1,70% ao mês e 20,4% ao ano, para o empréstimo pessoal consignado. O PagBank não trabalha com o cartão consignado.
O C6 Bank diz que ofereceu crédito consignado para beneficiários do BCP até o ano passado, quando essa modalidade foi suspensa, e retomou a oferta a partir da publicação da instrução normativa do INSS, feita na quarta-feira (13), cumprindo as taxas definidas pelo governo. As taxas máximas são de 1,91% para operações INSS e o prazo máximo é de até 84 meses.
O Bradesco iniciou os empréstimos consignados para beneficiários do BPC nesta sexta (15). O banco não informou, no entanto, quais as taxas de juros cobradas e se oferece ou não o cartão consignado. Em geral, os juros variam conforme o relacionamento do cliente com a instituição.
O Itaú Unibanco diz que oferecer apenas o crédito pessoal consignado, com taxa de juros de 1,91% ao mês, com prazo de até 84 meses. A prestação mínima é de R$ 150. Para contratar, o segurado deve apresentar documento de identificação, formalização do contrato e autorização para consulta de dados na Dataprev (empresa de tecnologia do governo federal). A contratação pode ser feita por celular, caixa eletrônico, nas agências ou por meio de correspondente bancário certificado.
A Caixa informa que após as normas publicadas pelo INSS, o banco iniciou as adequações necessárias para a retomada da oferta do crédito para beneficiários do BPC. “Para o crédito consignado, a princípio, as condições de oferta do produto serão as mesmas adotadas para os demais beneficiários do INSS, com taxa de juros a partir de 1,70%.” Segundo banco, o cartão consignado INSS encontra-se suspenso.
O Banrisul informa que está avaliando a modalidade de crédito, mas inicialmente não vai operar. O BMG e o Nubank disseram que não iriam participar da reportagem. Os demais não responderam.