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Sucessos da Bienal e Feira do Livro mostram Brasil que lê – 22/06/2025 – Ilustrada

Quando se soube que a Bienal do Rio e a Feira do Livro em São Paulo seriam ao mesmo tempo, muitos editores espernearam. Agora que ambos chegam ao fim, ainda se ouve que organizar, juntos, dois dos maiores eventos literários do país foi “insano”, “uma loucura total”.

Mas parece que valeu a pena. A Bienal registrou 740 mil visitantes, um aumento de 23% em relação ao público já massivo da última edição. O crescimento na venda de livros foi em proporção semelhante, de 5,5 milhões para esperados 6,8 milhões de exemplares.

Já a feira paulistana, que reuniu 64 mil pessoas em 2024, ainda não contabilizou números desta edição, mas as editoras também celebram aumentos. A Autêntica vendeu 140% a mais e a Record relata salto de 40%, por exemplo.

Mais moedas pingaram para as editoras no outro lado da ponte aérea. A Companhia das Letras distribuiu comunicado dizendo que esta Bienal do Rio “marca o maior evento” de sua história. A HarperCollins dobrou o faturamento da edição passada. Sextante e Rocco subiram cerca de 60%.

Está consolidado um momento de destaque dos eventos literários no Brasil, algo que a coincidência deste ano ajuda a acentuar —são duas trajetórias muito diferentes, mas que conversam.

Se bienais sempre foram marcadas por certo gigantismo, as últimas edições crescem cada vez mais enquanto o leitorado passa por certo encolhimento —a Bienal de São Paulo em setembro foi a maior em dez anos, com 722 mil visitantes, e dois meses depois a pesquisa Retratos da Leitura registrou que o Brasil perdeu 7 milhões de leitores em cinco anos.

A contradição não passa despercebida no mercado, que nota uma mudança no padrão de consumo do leitorado, que parecer estar deixando para comprar livros em grandes eventos.

Com estímulo do passeio familiar e rezando para achar bons descontos, muita gente viaja na direção de bienais ou feiras ansiando para conhecer autores ou passar um dia agradável. E acaba fazendo ali compras que represaram no resto do ano.

Como a experiência de fruição se torna mais importante que nunca, cabe registrar a melhora sensível na infraestrutura que se notou dos dois lados da via Dutra.

A Bienal ampliou a área que ocupa no Riocentro em mais de 40%, tirando de dentro dos pavilhões as praças de alimentação que deixavam estandes com cheiro de gordura. Ocupando melhor os gramados, o evento literário se parecia mais com um passeio no parque —ou como dizem seus organizadores, um “book park”.

Adições como a roda-gigante e os “escape rooms” literários se encaixaram com naturalidade num espaço que já ostenta aos quatro ventos priorizar o entretenimento para atrair os jovens aos livros. Ainda há desafios a superar, contudo, em termos de filas para estandes e autógrafos, muito mais desorganizados que o necessário, causando engarrafamentos enervantes de gente.

Já a Feira nadou de braçada no novo patrocínio da Petrobras, garantido só de última hora para esta quarta edição, mas que permitiu um avanço sensível em itens como banheiros públicos e um telão com altíssima qualidade de imagem e som.

Foi onde se puderam ver mesas ótimas com autoras como Amara Moira, Beatriz Bracher e Lídia Jorge e encontros como o de Mario Prata com Ugo Giorgetti e de Lina Meruane com Jorge Carrión. O programa ampliado nos tablados literários —em que a Folha também organizou suas mesas— serviu para oferecer um cardápio maior a paulistanos que pareciam ávidos por isso.

Para um festival centrado em apresentar autores em praça pública, fez falta uma programação principal com destaques mais parrudos —em outros anos, gente se acotovelou para ver Camila Sosa Villada, Patricia Hill Collins, Mia Couto, Rita Lobo e Sueli Carneiro. Nesta, a maior presença de público foi para o podcast Foro de Teresina, da revista Piauí, um programa mais distante dos livros.

Boa parte do elenco brasileiro da Feira do Livro já está em turnê apresentando seus lançamentos há algum tempo, reduzindo seu teor de novidade. Parcela deles, repartida com a própria Bienal.

Foi uma troca comemorada pela feira e pelas editoras —que, de resto, tiveram que trabalhar dobrado. Se participar de uma Bienal já é custoso em dinheiro e pessoal, fazer isso com outro evento simultâneo é uma dificuldade hercúlea em termos de fluxo de caixa, montagem de marketing, contratação de livreiros.

Mas como disse uma editora das mais animadas, agora os festivais literários se multiplicaram tanto que não dá mais para garantir que haverá datas exclusivas. É sintoma claro de como há espaço e demanda para eventos em torno do livro —que deu samba com a rima entre cariocas e paulistas, mas rende compassos o ano todo.

Festivais literários, como se sabe, não têm apenas a tarefa de agradar os leitores, mas a ainda mais trabalhosa função de formar os novos.

Na tarde do domingo, a Folha testemunhou uma menina de seus 13 anos concentrada numa estante da Bienal. Pegou na mão uma edição da Penguin de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, namorou capa e contracapa e decidiu, em silêncio, levar o clássico de Machado de Assis na direção do caixa. Se pode ser o retrato de um Brasil mais raro, ainda é um Brasil bem bonito de ver.

Colaboraram Bruna Fantti, Carolina Faria, Isadora Laviola e Yuri Eiras

Fonte: Folha de S. Paulo

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